CARTAS ABERTAS DE DENTRO DAS MASMORRAS ACADÊMICAS

Praga, 13/08/1817

       Querida Anne Belle meu coração está calmo por saber bem que neste momento ao leres minhas confissões de adolescente, estarás também sentindo todo o meu amor ao qual consigo despejar através desta tinta neste papel em branco. 
         Querida, sinto muitas saudades de nossas conversas no Bar do Antenor, seu tio. Das boas músicas que nós ouvíamos e de quando depois de algumas cervejas sempre cantávamos juntos. Aquela do Chico... como é mesmo o nome dela? 
          Gostaria de estar aí, ao seu lado. Mas o tempo nos pregou uma peça. Veja só, a rotina aqui só pode ser quebrada com muita criatividade ou com meus vícios. As aulas são bem atraentes, confesso, gosto dos desafios que nos são impostos para leitura de textos importantes. Hobbes, Maquiavel, Marx, Bonaccine, Comte, mas desses todos eu escolhi um certo Albert Shurtz que trata da Sociologia explicando como deve se comportar um "Estrangeiro" em uma sociedade alheia. É empolgante. Mesmo que as vezes seja mais um capítulo da rotina. Não lhe escrevo, querida, para reclamar ou encher de sentimentos negativos o vosso caprichoso espírito, ao contrário, quero encontrar e fazer ser sempre o vosso tão estimado nume claro, alvo, cintilante e cheio da mais bela fonte de luz alvoreante. 
       Todas as tardes após minhas leituras e fichamentos banho-me e troco-me para ir à escola. Pontualmente desço a rua que me conduz até a parada do transporte. Lá ainda tenho tempo para reparar em como as pessoas daqui se comportam, acendo um cigarro... eu vejo pequenas e belas crianças, com fardas de camisas claras, bermudas roxas e tênis sempre limpinhos ou as vezes encardidos do barro vermelho predominante nesta área, sendo trazidas dos colégios por seus pais ou irmãos mais velhos, vejo muitas motocicletas com seus condutores entrelaçando-se entre os veículos maiores, vejo pessoas que pelo andar apressadas e aparentemente cansadas, devem vir de seus trabalhos, são enfermeiras, pedreiros, motoristas, pessoas também que fazem exercícios, caminhando ou correndo, com bermudas e camisetas apropriados, o chão neste ponto da cidade é de asfalto escuro, piche do petróleo, propício para quem pratica caminhadas ou cooper. Quando chega o meu transporte sempre estou só, largo meu cigarro antes de entrar bem próximo à porta. Me sento na última cadeira do lado direito e abro bem as janelas. Vou sentindo o vento fresquinho do final da tarde azulada e vermelha e meus cabelos longos vão secando ao vento. Sempre esbarramos na estrada com um engarrafamento por causa das obras, como te mencionei antes, e essa demora é até bem legal. Fico me imaginando, as vezes, do lado de fora do transporte. Olhando para todos aqueles carros parados. Estranhando que uma ou outra pessoa desça e saia caminhando as vezes em frente as vezes voltando, sempre assim, e as vezes, também, eu fico somando os números das placas dos carros  que passam lentamente embaixo de minha janela escancarada. 
       Quando passamos pela obra o trânsito torna-se mais veloz. As pessoas de dentro desligam os celulares e acomodam-se padronizadas. Olham sempre em frente, não se mexem, não conversam, apenas esperam a sua vez de puxar um cordãozinho no teto do transporte que aciona uma sirene e alerta ao motorista para parar o transporte que alguém vai descer. De sorte que este transporte me deixa dentro do pátio da escola. (...)   

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