BASEADO NUMA SEDA REAL

NORDESTE BRASILEIRO - 1969

          Quase meio dia. A torre de controle de voo no Aeroporto Augusto Severo identifica o voo 325VASP Rio-Natal, o sinal é claro, a altitude e a velocidade para a aproximação de pouso perfeitas, mas um comunicado urgente do Sistema Meteorológico identifica uma corrente de ar, um vento forte,  contrária, em direção da pista de pouso, o que imediatamente o controlador repassa essa informação ao co-piloto que a transmite para o piloto. 
          Uma turbina explode violentamente ao meu lado e eu sou arremessado contra a outra poltrona. Abro os olhos e vejo a cabine do piloto se separando do resto aonde eu estava. Estamos caindo de bico. A ventania é muito forte. Vou desmaiar...
           Adormeci na metade do voo. Havia bebido uma garrafa de Gin na noite anterior com a Susana, uma portuguesa que conheci no supermercado, ficamos embriagados ouvindo Cazuza e Bob dilan. Fumamos um baseado e depois transamos no sofá. Quando amanheceu ela ainda dormia no tapete branquinho de artesanato que ficava sempre reservado para ocasiões especiais. Deixei um recado e fui embora. Meu voo sairia em poucos minutos.  
          Mas agora sinto que deveria ter ficado com ela mais um pouco. Nem tempo de fumar um cigarro vou ter. E o que consigo lembrar de toda a minha vida de 48 anos é dessa trepada com uma portuguesa. Porra.
           Estou me aproximando do impacto, vejo o chão chegando, o horizonte se alinha com o resto dos destroços do avião. Não consigo ver mais ninguém... é o fim. Infelizmente não terei tempo de terminar meu livro. Não plantarei mais nenhuma árvore, nem tão pouco verei meu filho se formar, bem... resumindo... ei, espere um pouco... o que é aquilo...
            Uma bacia enorme com água se abria embaixo de mim e eu não estava entendendo mais nada, seria uma última lombra do baseado, uma aparição do Demônio, ou a volta do super star jesus? Fechei meus olhos... o impacto ia ser o mesmo, a morte também estava a me abraçar.
                 Soltei-me da cadeira. O corredor do avião estava limpo, sem sangue, sem objetos, ou pedaços do avião. Caminhei até o local aonde não havia a cabine. De fato, não havia a cabine. Um vento frio invadiu aquele pedaço do avião. Ouvi vozes. Pensei estar ficando louco, acho que morri e que essa voz deve ser algum anjo do inferno me chamando pra alguma festinha... mas a voz silenciou. Eu estava vivo. Vivo? 


  

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